Por Marcelo Weick para o Tribuna do Advogado
O financiamento das campanhas eleitorais sempre foi e continuará sendo uma das questões mais delicadas para a democracia no Brasil e no mundo. Não há modelo ideal, tampouco imune à corrupção e aos desvios de finalidade.
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (ADI 4650) em proibir o financiamento pelas empresas privadas foi uma tentativa, talvez ineficaz, de diminuir o volume de dinheiro nas eleições e de inibir eventuais relações espúrias entre os candidatos e as pessoas jurídicas patrocinadoras de campanhas políticas.
Primeiro, porque a proibição em si da doação de pessoas jurídicas não impedirá que as empresas interessadas em manter ligações mais estreitas com candidatos continuem a contribuir às suas campanhas, fazendo-o agora por vias oblíquas, pelo caminho do “caixa dois”, como assim aconteceu durante as eleições de 1989 (caso Collor). As eleições 2016, as primeiras após a referida decisão do STF, poderão ser usadas como um bom campo de pesquisa empírico para apurar o que ora se defende: melhor a luz (transparência) do que as trevas (ocultação).
Segundo, porque também forçou o Congresso Nacional a correr contra o tempo e criar um duvidoso modelo de financiamento híbrido de campanhas eleitorais, de um lado, com doações de pessoas físicas, diretamente ou por intermédio do financiamento coletivo (Crowdfunding – art. 23, §4°, inciso IV, da Lei 9.504/97), e, de outro, com o emprego massivo de dinheiro público (Fundo Partidário e Fundo Especial de Financiamento de Campanha Eleitoral – art. 16-C e 16-D da Lei 9504/97).
Esta também é a discussão a ser enfrentada pelo Supremo diante do tema da limitação do autofinanciamento das campanhas eleitorais (ADI 5914, relator ministro Dias Toffoli).
Os partidos políticos PT, PDT, PSOL e PC do B insurgem-se contra a possibilidade de financiamento integral da campanha via recursos do próprio candidato, regulada pelos artigos 17, inciso I, 18, 22, 29, §1°, e 33, §1°, todos da Resolução 23.553 do Tribunal Superior Eleitoral (DJE-TSE 25, de 2/2/2018), embora ocorrida revogação do §1°-A, do artigo 23, da Lei 9.504/97 pela Lei 13.488/2017 (art. 11) que assim literalmente o autorizava.
Além das questões de ordem jurídico-formal (a fim de verificar se uma resolução do TSE tem o poder de regular matéria outrora prevista em permissivo legal revogado), o que se questiona é se a proibição ao autofinanciamento integral per si neutralizará a força do poder econômico nas eleições, ou se lançará nosso modelo de financiamento para um terreno cada vez mais hipócrita, subterrâneo e oculto.
Diz-se isso porque já existe um limite legal de receitas e gastos para todas as campanhas eleitorais, independentemente do uso de recursos públicos ou privados, próprios ou de terceiros (pessoas naturais).
Ademais, as melhores práticas para financiamento de campanhas eleitorais apontam para a maximização da transparência em detrimento de mecanismos proibitivos que só estimulam a vida política marginal.
Como se ainda não bastasse, a probabilidade de fraude ou abuso do poder econômico não se manifestaria apenas no autofinanciamento. Pode ser também detectável na utilização de doações individuais simuladas de terceiros, pulverizadas a partir de um patrocínio oculto triangulado por fonte vedada, por exemplo.
Por fim, atirar-se contra o autofinanciamento integral pode inibir, por exemplo, o surgimento de outros atores políticos avulsos, não tão próximos às preferências e enfronhados com o establishment das corporações partidárias.